Washington Olivetto é um dos maiores nomes da publicidade brasileira. Criador de campanhas de sucesso como o “Primeiro Sutiã”, de Valisere, o “Garoto Bombril” e o cachorrinho da Cofap, foi um dos principais empreendedores da propaganda nacional, ao fundar, em 1986, a W/GGK —que, mais tarde, se transformaria na icônica W/Brasil.
Desde 2017, Olivetto mora em Londres, na Inglaterra, com a mulher, Patrícia, e os filhos, Antônia e Theo. Ainda ligado no dia a dia da propaganda mundial, o criativo falou com exclusividade à reportagem do UOL.
No papo, Washington aborda a mudança radical que a publicidade deve encarar nos próximos meses, além das lições que o mundo pode tirar para a vida pós-pandemia. Confira.
A publicidade está em um “momento de transformação”. Com a pandemia, essa transformação será acelerada? Qual o cenário?
Já fazia um bom tempo que a publicidade, tanto no mundo quanto no Brasil, não caminhava bem sob os pontos de vista criativo e negocial, precisando se reinventar. Agora com a pandemia, esse problema cresce e a necessidade de reinvenção se transforma em obrigatoriedade de re-reinvenção. As agências “gordas”, com estruturas inchadas, que já estavam faz algum bom tempo precisando ir para um spa emagrecer por uma questão estética, agora vão ter que emagrecer por uma questão ética e de sobrevivência.
O mais importante na comunicação é saber encantar e seduzir
A tese defendida particularmente por consultorias, de que o mais importante no negócio da comunicação é saber mensurar os resultados, vai perder seu breve reinado. Já se voltou a perceber que, seja qual for a mídia, analógica ou digital, tradicional ou recente, o mais importante na comunicação é saber encantar e seduzir.
Dados, então, não substituirão boas ideias?
As grandes ideias vão voltar a reinar, porque só elas são capazes de encantar e seduzir, gerando, por consequência, os resultados que provocam satisfação e orgulho quando mensurados. Sem grandes ideias não acontece nada. Não tem resultado para mensurar. Essa é a verdade.
Sobre a existência das agências num futuro próximo, o cenário também é claro: só sobreviverão as agências dos grandes grupos e, mesmo assim, lutando com enormes dificuldades. Também sobreviverão as agências independentes extremamente talentosas, porque essas sempre serão as exceções que sobrevivem a qualquer regra. Quem não for de um grande grupo nem independente brilhante deixará de existir.
Um estudo da Kantar diz que as marcas que anunciam em momentos de crise crescem cinco vezes mais do que as outras. Mas a crise de hoje é, digamos, “diferente”. É hora de investir em comunicação?
Sempre é hora de investir em comunicação, mas de acordo com as necessidades e prioridades do momento. Analisando os dias de hoje, agora não é hora de vender, é hora de informar. Agora não é hora de persuadir, é hora de prestar serviço. As empresas que fizerem isso sairão mais fortes desse momento.
Consumidores preferem comprar de empresas bem-humoradas
Empatia e bom humor podem ser um caminho que as marcas podem seguir neste momento de pandemia? Quais são bons exemplos que têm surgido pelo mundo?
Assim como as pessoas preferem conviver com pessoas bem-humoradas, ao invés de pessoas mal-humoradas, os consumidores preferem comprar de empresas bem-humoradas, ao invés de empresas mal-humoradas.
Bom humor passa simpatia e autoconfiança, características típicas dos grandes vencedores. Mesmo num momento dramático como o que vivemos, o humor (quando pertinente) pode ser uma poderosa arma de vendas e construção de imagem.
Nos últimos anos, uma campanha bem humorada tratando de problemas sérios se destacou: Dumb Ways to Die (Maneiras Estúpidas de Morrer) foi uma campanha australiana sobre os acidentes sofridos por pessoas que prestavam maior atenção nos seus telefones celulares do que na vida que estavam vivendo.
Os grandes eventos de inovação e criatividade, como SxSw e Cannes Lions, foram cancelados. Pode ser o momento de uma quebra de paradigma para o mercado de premiações e eventos globais? O investimento pode tomar outros rumos?
O festival de publicidade de Cannes, que administrou mal sua ambição nos últimos anos, exagerando na sua busca obsessiva por ganhar dinheiro, já vinha em decadência. Perdeu sua importância como documentador da atividade e como premiação, por ter passado a distribuir prêmios em quantidades industriais.
Comentários entre os profissionais de primeiro nível do negócio da publicidade mundial diziam que qualquer um que visitasse Cannes na semana do Festival podia ser atingido por um prêmio.
Por outro lado, também na busca de ganhar dinheiro, o Cannes Lions tentou invadir a área de eventos e palestras nos últimos anos, características de acontecimentos como o SxSw. Inicialmente, ganhou em termos de frequência e faturamento, mas, evidentemente, perdeu em prestígio.
Enquanto isso, o SxSw, em Austin, foi ganhando o seu espaço, até por ser mais variado e custar menos do que Cannes. É provável que, daqui para frente, os dois tenham dificuldades de sobrevivência. Até porque eventos que aglomeram muitas pessoas terão uma tendência a serem repensados. Acredito que o Cannes Lions terá ainda mais dificuldades, porque já vinha na curva descendente.
Espero que, quando a pandemia acabar, tenhamos um mundo menos poluído e poluente
Quais são as boas lições que o mercado publicitário pode tirar deste momento?
A vida e o mercado publicitário podem tirar lições disso tudo. Espero que, quando a pandemia acabar, tenhamos um mundo menos poluído e poluente. E uma publicidade menos poluída e poluente.
Acredito que conseguindo se re-reinventar, a publicidade pode voltar a ter momentos de prosperidade criativa e de negócios. Menores do que os vividos no seu auge mundial, entre 1980 e 2000, mas dignos de serem saudavelmente aproveitados.
autor: Renato Pezzotti
fonte: UOL ECONOMIA