Em Bend it like Beckham (Driblando o destino), filme britânico de 2002, uma jovem jogadora de 18 anos explica a uma amiga que “ninguém consegue chutar a bola com efeito como Beckham” — uma referência à incrível capacidade do jogador de futebol David Beckham de marcar gols com chutes de efeito que fazem a bola girar em seu percurso pelo ar.
Com o anúncio recente de que Beckham havia assinado um contrato histórico estimado em 250 milhões de dólares para jogar pelo Los Angeles Galaxy durante cinco anos, o talento do jogador para estratégias de “efeito” — que driblam o jeito convencional de lidar com o mundo do futebol, de fazer negócios e de conduzir sua vida pessoal — aparece incrivelmente intacto. Beckham não só é considerado um dos melhores jogadores de futebol do mundo, como também uma marca global que conta com o lucrativo endosso de marcas célebres como Adidas, Gillette, Got Milk?, Pepsi, Snickers, Candy Bar e Motorola. Seu casamento com a ex-Spice Girl Victoria “Posh” Beckham, e sua amizade tão explorada pelos meios de comunicação com celebridades do cinema como Tom Cruise e Katie Holmes vêm tão-somente reforçar a magia que o cerca.
Contudo, especialistas da Wharton na área de esportes e marketing questionam se Beckham conseguirá fazer jus a toda a enorme expectativa em torno do negócio e de sua saída do Real Madrid, da Espanha, para o Los Angeles Galaxy. Será que Beckham, que segundo alguns analistas estaria vivendo o crepúsculo de uma carreira brilhante, será capaz de usar sua fama estelar não só para incrementar a receita do time, mas também para melhorar a imagem da Primeira Divisão do Futebol, ou Liga Principal de Futebol (MLS, de Major League of Soccer)?
“É uma aposta arriscada. Entretanto, sempre há riscos quando tanta coisa depende de um único indivíduo, quanto tudo gira em volta da marca de uma pessoa”, observa Lisa Bolton, professora de Marketing da Wharton. “No caso específico de Beckham, a questão é saber se ele conseguirá dar conta de tudo isso. O time não precisa lhe dar nenhum destaque especial em suas campanhas publicitárias para despertar a atenção do público em relação ao futebol. Além disso, Beckham já aparece nas manchetes do noticiário de entretenimento. É ótimo que o esporte seja visto por esse ângulo, principalmente em Los Angeles.”
Kenneth L. Shropshire, professor de Estudos Jurídicos e de Ética nos Negócios da Wharton e diretor do Projeto de Negócios Esportivos da instituição, observa que o contrato de Beckham é um dos mais altos do segmento esportivo americano. Com o acordo, o astro será catapultado para um patamar especial de superatletas como Tiger Woods, estrela do golfe, cujos rendimentos chegariam a 100 milhões de dólares anuais, e Michael Schumacher, astro da Fórmula 1, com renda estimada em 60 milhões de dólares anuais. O contrato de Beckham, de 50 milhões de dólares ao ano, é uma combinação de salário, royalties, comerciais e endossos que o colocam à frente de lendas do basquete como Michael Jordan e Shaquille O’Neal; de zagueiros do futebol americano como Peyton Manning, Michael Vick e Matt Hasselbeck; de Alex Rodriguez, jogador de beisebol, e de Lance Armstrong, sete vezes ganhador do Tour de France.
Do ponto de vista estritamente comercial, um possível motivo de preocupação, de acordo com Shropshire, seria o fato de que a transação ocorre no contexto de “um esporte que gera, provavelmente, a menor receita entre todas as modalidades esportivas dos EUA”. Shropshire acrescentou ainda que não estava criticando a decisão da liga de contratar Beckham. “Sei que há pessoas muito inteligentes à frente da MLS. Tenho certeza de que se trata de um lance estratégico, mas que — nas palavras do seu presidente — não será nenhuma poção mágica capaz de mudar o rumo das coisas e fazer do futebol um esporte tão popular nos EUA quanto no resto do mundo. O contrato é parte de uma estratégia evidente. Beckham é talvez o nome mais conhecido do futebol no mundo todo. Mesmo quem não sabe nada de futebol sabe quem ele é.”