Vamos combinar uma coisa: design é uma palavra com um significado tão complexo e polêmico, que em todo congresso ou seminário de design há sempre pelo menos um artigo discorrendo sobre o assunto. Em português, não se conseguiu chegar a
um termo que o traduzisse corretamente, então resolveu-se usar o original em inglês mesmo. Por isso, não caia na tentação simplista de traduzir design como projeto ou desenho.
O nosso popular e polêmico termo foi criado na época da revolução industrial. Fazendo um resumo bem grosseiro, pode-se dizer que, com a possibilidade de se fabricar produtos em escala, a primeira idéia foi tentar reproduzir a estética conhecida até então, aquela dos produtos elaborados e produzidos caprichosamente por artesãos talentosos.
Mas veja bem: se com toda as máquinas e tecnologias que dispomos hoje já é difícil reproduzir industrialmente uma cadeira estilo Luís XV, imagine só naquela época, com aquelas máquinas toscas e primitivas? É lógico que o resultado ficou abaixo da crítica e todo mundo detestou. Mas era preciso fabricar e vender produtos. Então, vários grupos de artistas e intelectuais se reuniram para tentar elaborar um conceito que se permitisse conceber produtos que já fossem pensados, desde a idéia inicial, para serem produzidos em escala.
Nessa época de grande efervescência cultural (final do século XIX e início do século XX) surgiram vários movimentos, como o Arts and Crafts, o Art Nouveau, o Art Deco e o Werkbund, e a mais famosa escola de design do mundo, a Bauhaus. Esse novo conceito de conceber pensando na fabricação em escala foi que deu origem que hoje conhecemos como design.
Há várias e diferentes definições para o termo, mas a que mais me parece logicamente fundamentada é aquela que diz que o design sustenta-se sobre um tripé: um bom projeto, que possibilite a produção em escala; um conceito que explique porque o objeto é feito dessa maneira e não de infinitas outras possíveis, com suas funções e porquês; e a preocupação estética (senão não vende).
Assim, fica fácil a gente entender melhor a idéia e utilizar o termo de uma maneira que faça sentido. Quando alguém diz que faz fashion design, está dizendo certo. A moda exige que se faça o projeto de uma coleção com os moldes e desenhos de roupas que permitam que elas sejam produzidas em escala depois; tem o conceito, que explica porque é que tais materiais, tecidos e aviamentos foram escolhidos em detrimento de outros; e, é claro, a preocupação estética (esta última, aliás, um conceito cada vez mais flexível que merece uma reflexão à parte).
Já um cabelereiro que diz que faz hair design está usando o termo de maneira equivocada. Ou alguém já viu um projeto de cabelo para ser produzido em série? O conceito e a preocupação estética com certeza existem , mas o tripé não se sustenta só com isso, falta um perna: o projeto. As cabeças, os cabelos e as pessoas são diferentes, não dá para produzir isso em série. Aliás, o grande diferencial de um bom cabeleireiro é justamente ele encontrar a solução que melhor convém a você e a mais ninguém.
É por isso que é de se estranhar que muita gente use o termo design para se referir ao estilo e à personalização do serviço. E design é o contrário do que é personalizado. Design é uma solução concebida para se produzir em massa (pelo menos o conceito original nasceu dessa premissa). Assim, arranjos florais personalizados não são flower design e tatuagens não são body design.
Mas você deve estar pensando: mas a marca gráfica da minha empresa é personalizada, eu não a comprei em um catálogo. Certíssimo: a solução é específica para a empresa, mas o manual de identidade visual é o projeto que vai permitir que a marca seja reproduzida em massa por aí, da papelaria ao outdoor, do uniforme à frota de veículos, sem ser distorcida e sem perder o contexto. Isso é fruto de um projeto, que deve ter um conceito (que traduz a identidade da empresa) e uma preocupação estética (ninguém quer uma marca feia). Um site na Internet, por sua vez, também se enquadra no conceito, pois precisa de um projeto que permita que ele seja reproduzido em escala (a mesma tela aparece em milhares de outros computadores igualzinha), um conceito e uma preocupação estética. Por isso, existe o que se conhece por webdesign.
Mas, atenção, se você encontrar por aí uma loja de design personalizado, não fique dando aquela risadinha de deboche. As pessoas usam os termos de maneira inadequada porque quem aprendeu o que a palavra significa não compartilha o seu conhecimento com todo mundo. Compartilhe o que você sabe. Todo mundo só tem a ganhar, incluindo cabeleireiros, floristas, tatuadores, estilistas, programadores, e, quem diria, até os designers.
autora: Lígia Fascioni
fonte: www.ligiafascioni.com.br