Vida de freelancer

Por opção – e tendência -, cresce o número de profissionais autônomos

Segunda-feira, seis da manhã. Enquanto grande parte dos profissionais com registro em carteira se prepara para cumprir uma jornada de oito horas de trabalho, o designer Eduardo Vicente Gonçalves, 24 anos, curte um pouco mais a cama. Às 9h00, quando muitos já estão envolvidos com a rotina do dia-a-dia, ele acorda e aprecia o café da manhã. Por volta das 10h00 (momento em que boa parte dos assalariados já sonha com o descanso do almoço) é hora de ir trabalhar, mas sem o estresse do trânsito e o melhor: sem a obrigação do traje social. Se quiser, vai de pijama mesmo.

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É do escritório de casa que o freelancer toca sua vida profissional e, quando precisa, encontra tempo para resolver seus problemas pessoais (um cano furado, uma conta para pagar), além de se dar uma folga para tirar um cochilo ou assistir a uma partida de futebol quando estiver sem inspiração para o trabalho. Resumindo: dentro de casa, Gonçalves é free.

“Não gostava de ter que pedir permissão até para ir ao médico e ser escravo do relógio. Troquei os benefícios do emprego de carteira assinada pela minha liberdade”, conta o designer. Hoje, ele não tem dúvida de que está mais feliz. “Trabalho o suficiente para sobreviver e prezo muito pela minha qualidade de vida. Sempre que possível ponho o meu notebook nas costas e caio no mundo. Esse ano mesmo, paralelamente aos meus projetos, consegui dar uma escapada para a Argentina e para o Uruguai.”

Ao pé da letra, a palavra free significa liberdade, ou seja, sem patrão nas costas e muito menos cartão de ponto. O que, na maior parte dos casos, se traduz em horários de trabalho mais flexíveis. Não é à toa que muitos profissionais têm optado por este caminho e, assim como Gonçalves, são conhecidos como freelancers

Tendências

Por trás do atraente slogan de liberdade atrelado à rotina do freelancer, também há mudanças no mercado de trabalho responsáveis pelo crescimento desta modalidade de profissional. “Novas condições de contratação, além da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) surgiram como mais uma forma de atender as demandas das empresas e driblar o desemprego. Uma delas foi a PJ (Pessoa Jurídica)”, aponta a consultora de recursos humanos da Career Center – empresa de orientação profissional – Malú Giacomazzi. Não é à toa que o método de trabalho que começou como tendência nas áreas de Jornalismo, Design, Propaganda e Tecnologia da Informação, já se expandiu para outros segmentos como por exemplo, Arquitetura e Letras.

De acordo com a consultora, grande parte dos profissionais que se aventuram nessa direção, o fazem por conta das dificuldades em encontrar uma colocação no mercado de trabalho. A produtora Renata Padovani, 29 anos é um exemplo. Há cinco anos como “freela” ela culpa a falta de oportunidades em sua área. “Cada vez menos as empresas querem manter vínculos com os empregados. Isso diminui bastante a oferta de emprego”, desabafa. “Atuar como autônoma é uma solução para driblar essa crise e tem lá as suas vantagens, mas confesso que gostaria de ter um emprego fixo para ter mais garantias profissionais”, completa.

Ainda que tenha atrativos, também é preciso lembrar que existem desafios na vida dos freelancers. Um deles, é lidar com a falta de estabilidade financeira. Em um mês é possível conseguir diversos projetos e ganhar três ou até quatro vezes mais do que um funcionário CLT. No próximo, porém, nenhum trabalho pode aparecer. No fim de cada mês, o resultado depende única e exclusivamente do freelancer. Por isso os contatos são a base desse trabalho. “O boca a boca e o famoso QI (quem indica), são nossas principais fontes de trabalho”, diz a produtora Renata.

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Se iniciativa para correr atrás do trabalho é fundamental, organização para não passar aperto no final do mês também não fica atrás. “Disciplina e a organização financeira devem ser as principais características de um freelancer”, alerta Malú. Fundo de garantia, férias remuneradas, 13º salário, assistência médica e INSS também não fazem parte dos benefícios de um profissional autônomo, a não ser que ele queira “pagar por fora” para obtê-los. Por isso, a consultora recomenda que o profissional considere esta questão na hora de aceitar um projeto. “Negocie um valor que possa cobrir as despesas com esses encargos, afinal, são garantias para o futuro e podem ser bastante úteis diante de um imprevisto”, aconselha.

Limitações

Mesmo sendo freelancer, o profissional da área de Sistemas de Informação Danilo Rodrigues, 22 anos, mantém uma rotina similar a dos funcionários com registro em carteira. Tem horário para sair e para entrar na empresa, faz uma hora de almoço, tem obrigações diárias e é subordinado a um chefe. No entanto, os benefícios não são os mesmos. Nada de assistência médica, férias remuneradas e nem mesmo vale alimentação ou refeição. Pode até parecer injusto, mas Rodrigues só está se adequando ao mais novo modelo de contratação adotado por algumas companhias: freelancer fixo.

A regra trabalhista é bem clara quanto a esse assunto. Primeiro, uma empresa só pode terceirizar os serviços secundários. Ou seja, se a companhia atua na área de Medicina, ela não pode terceirizar os médicos, mas a áreas de contabilidade e administração sim. Depois, deve-se levar em conta a habitualidade e a subordinação do trabalho. “Esses dois conceitos é que diferenciam um empregado de um freelancer”, ressalta o procurador do Ministério Público do Trabalho de São Paulo Fábio de Assis Fernandes.”Durante os últimos seis anos já passei por três empresas com esse mesmo esquema de contratação. Os deveres são os mesmos de um profissional contratado, mas os direitos não. As ofertas de CLT em Tecnologia são cada vez menores. Por isso, ou você aceita a proposta ou fica desempregado”, desabafa Rodrigues. “Quero muito conseguir algo fixo para ter mais segurança e poder colocar a cabeça no travesseiro sem me preocupar com o futuro”, confessa.

Isso significa que se o autônomo exerce atividades regulares em uma empresa, além de ser subordinado a alguém, sua função pode ser considerada deturpada e a companhia contratante pode sofrer todas as sanções previstas no direito trabalhista. “Mas é preciso fazer uma análise concreta de caso a caso”, afirma Fernandes.

autora: Larissa Leiros Baroni
fonte: Universia

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