Em cinco décadas, o desenhista José Carlos de Brito e Cunha (1884-1950) criou cerca de 100 mil ilustrações. Média de seis por dia. Mas era durante o reinado de Momo que se esbaldava com a infinidade de personagens que tomavam as ruas. Com traço até hoje moderno, representou como ningu ém o carnaval de nossa terra.
Vagabundos, vedetes e donas de casa. Guerras, remodelações urbanísticas, lançamentos de moda. A alta classe, políticos e favelados. Nada escapava ao olhar de nosso maior cronista visual. Através de vasta galeria de situações e personagens, J. Carlos não apenas registrou as transformações da sociedade da primeira metade do século 20. Analisou, interpretou e, sobretudo, satirizou tudo o que viu pela frente.
De 1904 a 1950, trabalhou em mais de 40 publicações. Os principais jornais e revistas brasileiros distribuíam seus desenhos e caricaturas para todo canto. Careta, O Malho, Fon-Fon, Para Todos, O Cruzeiro, Eu Sei Tudo. De um tempo anterior à disseminação da fotografia, J. Carlos era grande estrela em qualquer publicação. Ele nos remete a um momento específico da história, mas sua obra se mostra hoje surpreendentemente moderna.
“ Os desenhos têm uma perenidade desconcertante”, diz o jornalista e escritor Zuenir Ventura. “Ao contrário de sua linguagem gráfica, a escrita de seu tempo envelheceu. Ficaram obsoletos a ortografia, o vocabulário, a sintaxe e às vezes até a semântica. Em compensação, seus desenhos ainda palpitam, cheios de gra ça e frescor.”
Para comprovar as palavras de Zuenir, basta comparar qualquer desenho de J. Carlos com o texto adiante, Escól Desalojado, de 1926. Hoje, quem escrevesse assim seria “caduco”; mas quem desenhasse como J. Carlos seria moderníssimo. Criador compulsivo, produziu cerca de 100 mil obras. São quase seis desenhos por dia, e isso na hipótese de ter trabalhado 365 dias por ano durante 46 anos.
“LOUCURA DE QUANTIDADE”
Havia uma época em que a produção de J. Carlos se avolumava: no carnaval, festa máxima de seu Rio de Janeiro. O desenhista Cássio Loredano, guardião e disseminador da obra do artista carioca, relata que apenas na Careta de 13 de fevereiro de 1915, por exemplo, desfilam nada menos do que 29 desenhos de J. Carlos, entre capa, charges, vinhetas e cartuns.
“ E todo ano era essa loucura de quantidade”, completa Loredano.
Diante da enorme oferta de figuras que surgiam, o desenhista vibrava. Trabalhava sem parar. E acabou por estabelecer a moderna fisionomia do carnaval carioca. Serpentina e confete. Sambas e marchinhas. De um lado, os freqüentadores dos bailes fechados e das festas das elites; de outro, o carnaval negro e descalço que tomava as ruas em ranchos e blocos. O malandro autêntico, o pierrô, a colombina. Classe média em automóveis. O servidor troca terno e gravata por outra fantasia. O mendigo recolhe tudo na Quarta-Feira de Cinzas. Parte de um universo fascinante reproduzido e sintetizado por quem melhor transmitiu visualmente o embrião do carnaval que vivemos até hoje.
J. Carlos, Para Todos e o Pierrô
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O fato de pensar as quatro capas simultaneamente permitiu ainda que J. Carlos soltasse sua imaginação para além das combinações cromáticas, criando no carnaval de 1927 quatro capas que juntas contam uma história. Na primeira, sob os auspícios da lua, Colombina se deixa seduzir por Arlequim, enquanto Pierrô assiste a tudo, desolado. Na segunda, o dia está raiando, Pierrô olha perplexo para Arlequim morto à sua frente. Podemos perceber que, ao lado de sua mão direita aberta, a fumaça ainda sai do revolver caído no chão. Terceira capa: terça-feira gorda, sol a pino, emoldurando a cabeça de Arlequim carregada numa bandeja, como um são joão batista, pela amante Colombina, que dança alegremente nos ombros de seu Pierrô. Quarta-feira de cinzas, quarta capa. Nela, um diabo gigantesco varre, entre serpentinas e confetes, os tolos Pierrô e Arlequim. A Colombina pela qual se disputaram a esta altura já está em casa, sonhando com os anjos. Ao lado, sem nenhum medo de ser varrida por aquele diabo que conhece bem, uma cabrocha faceira assiste à cena com ar de desdém.
O texto e as capas acima foram retirados do ensaio “J. Carlos, designer”, de Julieta Costa Sobral. Faz parte do livro “O Design Brasileiro Antes do Design”, organizado por Rafael Cardoso e editado pela Cosac Naify. O livro é composto de nove ensaios sobre aspectos da história gráfica brasileira entre 1870-1960, comprovando que houve considerável produção que poderia ser chamada de design antes da década de 60.
Para completar uma curiosidade interessante sobre o ilustrador:
Walt Disney e a polêmica com o Zé Carioca
autores: matéria 1: João Rocha | matéria 2: Tarcízio da Silva
fontes: Almanaque Brasil | Papel e Furia
agradecimentos: Tarcízio Silva que sugestionou em comentario no post Carnaval e Marketing sobre J.Carlos e sem querer agora que vi que a segunda matéria que coloquei é do seu blog. Obrigada pela sugestão de leitura sobre este artista, valeu a pena!
Respostas de 3
Vá para o Carnaval 2009 do Rio de Janeiro ou da Bahia e curta muita pacandaria, ou um arrastão, e um assalto, ou ganhe uma Bala Perdida que vem dos vagabundos.rsrsr
Isto mesmo turistas vão para lá para contribuir para as os ladrões de favela, eles adoram trouxas.rsrsr
Oi TarciZio 😉 já arrumei seu nome, millllllllllllll desculpas!!!
Pra quem quiser conferir as dissertações que o Tarcízio mencionou, vale a pena a visita la no blog dele: Papel e Furia, no post J. Carlos, Para Todos e o Pierrô e conferir os links além do blog todo que vale a pena, tem posts otimos por lá.
Abraços
Nada. Dêem olhada nos links que atualizei no final do post. Tem dois links para a página da PUC-RJ que permitem baixar dissertações sobre a obra dele.
Ah, e ajeitem meu nome. Tenho trauma. É Tarcízio com Z. Heheheh.
abçs!